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José Luís Peixoto

VALLADOLID, YUCATÁN, MÉXICO

Atualizado: 27 de ago. de 2021

Como uma cor, o tempo



Francisco Cantón Rosado foi um militar e governador de Yucatán, no México. Ainda adolescente, já tinha experiência de combate na que ficou conhecida como a “guerra das castas”, um conflito que arrasou a resistência indígena, em 1848, após uma ocupação da cidade e das fazendas circundantes durante alguns meses. Hoje, a praça principal de Valladolid tem o seu nome. Mais uma vez, os vencedores escrevem a história e batizam a toponímia.


Após o século XVI, este sinal revela uma constante da história de Valladolid, no estado de Yucatán. O conquistador espanhol Francisco de Montejo estabeleceu a sua cidade por cima da localidade maia Chauac-Hà. Deu-lhe nova vida, com um nome que já conhecia e que conseguia pronunciar com facilidade. Essa era uma prática comum, “fundar” cidades em cima de aglomerados populacionais já existentes, construir igrejas exatamente no espaço de templos maias demolidos. Essa estratégia permitia, por um lado, afirmar supremacia e, por outro, aproveitar os materiais. No século XVI, dispor de pedra abundante e já cortada era uma vantagem considerável para a construção.


Hoje, quase quinhentos anos depois, a cidade que encontramos tem marcas desse passado. A tal praça principal e as ruas à volta mantêm a traça colonial, alguns edifícios datam desse período. Esse começou por ser o caso da Igreja de San Servacio, que domina uma das faces da praça, e que foi mandada construir por um padre espanhol. No entanto, o edifício que hoje vemos, e que continua muito ativo, com os sinos a chamar para a missa várias vezes por dia, ergueu-se no século XVII, uma vez que, em 1703, foram mortos dois governantes no seu interior, num episódio a que se chamou “el crimen de los alcaides”, o que levou à demolição da igreja original e à sua total reconstrução com a entrada virada a norte.


Hoje, para além dos edifícios e dos nomes, para além desta ressonância colonial, existem também as pessoas que povoam o centro e toda a cidade, muitas a falarem um idioma que deriva diretamente do que era usado pelos maias, são gente que mantém usos e saberes com origem nesses tempos. E, em simultâneo, existe o México atual, com toda a sua cor, com toda a sua exuberância e alegria.


Como tantas outras coisas que também se cruzam na praça principal de Valladolid, em Yucatán, são esses três mundos que aí se encontram. Fazem-no em volta da fonte que marca o centro do parque, podem ser vistos a partir do magnífico terraço do Hotel El Meson del Marqués. Ao fim da tarde, um impressionante coro de milhares de pássaros cobre a praça, enche as copas das árvores. São o acompanhamento musical perfeito para os namorados, sentados em cadeiras de cimento que têm uma forma pensada para os colocar frente a frente ou, também, para as filas que se alinham diante das barraquinhas que vendem doces de sabores inusitados para os europeus, picantes muitas vezes, como é o caso dos elotes (espigas de milho cobertas de vários condimentos) e muitas outras ofertas, das quais destaco as marquesitas (tubos de bolacha recheados de queijo e outros ingredientes). Ao mesmo tempo, esses sabores são metáforas de um México com grandes contrastes, história e presente, doce e ácido, a combinar ingredientes que nos surpreendem, um mundo novo.




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