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  • José Luís Peixoto

MANÁGUA, NICARÁGUA

Cidade invisível


Em Manágua, os fantasmas existem, há muita gente que ainda os vê.


Em 1972, a capital da Nicarágua sofreu um terramoto de enorme intensidade. Dada essa violência e a precariedade das construções, calcula-se que cerca de 90% da cidade terá ficado destruída. Ao longo dos anos setenta, a elite governante roubou toda a ajuda internacional que foi enviada para reconstruir a cidade. Não há quem desminta a crueza desta afirmação.


Em 1979, iniciou-se a revolução Sandinista que deu origem a um conflito que terminou em 1990. Após essa guerra civil de 11 anos, mais de 20 anos sobre o terramoto, foi já em meados dos anos noventa que, muito devagar, se iniciaram algumas obras públicas. Nessa época, o centro da cidade já deixara de ser claramente identificável.


Ao mesmo tempo que alguma construção foi crescendo junto dos edifícios que resistiram ao terramoto, a guerra civil fez com que fossem surgindo comunidades dispersas, em áreas afastadas. A necessidade fez com que muita população se instalasse junto às reservas de água. Todas essas construções foram desenvolvidas sem uma ideia urbanística que as estruturasse.


As ruas novas não seguem o traçado das antigas. Ainda hoje, em Manágua, quando alguém indica caminhos ou localizações, o mais comum é usar referências de lugares que não existem há muitos anos: qualquer coisa fica a x metros a oeste do antigo teatro, ou qualquer coisa fica a x metros a norte do antigo mercado.


Como numa das cidades descritas por Marco Polo a Kublai Khan, no livro de Ítalo Calvino, existe a Manágua visível e a invisível, dependem uma da outra, são reais uma e outra.


Não se encontra muita gente nos passeios. A grande dispersão da cidade desencoraja caminhadas e promove muitos terrenos baldios. A primeira imagem de Manágua, a que mais fica na memória, são imensas estradas, muito amplas, congestionadas com todo o tipo de trânsito, poluição e sol, malabaristas a aproveitarem os segundos de um semáforo vermelho diante de uma multidão de motorizadas.



Manágua é a segunda metrópole mais populosa da América Central, logo após a Cidade da Guatemala. Os números relativos a crimes condizem com essa proporção no âmbito dessa região do mundo. Com muitas cautelas, normalmente, são sugeridas duas visitas ao estrangeiro mais insistente: a Catedral de Santiago, um dos poucos edifícios que resistiu ao terramoto, e o Puerto Salvador Allende, onde se paga bilhete para entrar numa área renovada com restaurantes e salsa ao vivo.


Mas faltaria falar das pessoas. São elas que fazem Manágua. Em qualquer ponto da cidade, apesar das cicatrizes do passado, apesar das dificuldades do presente, as pessoas sorriem, são delicadas, sempre atenciosas. Vale a pena atravessar o mundo para conhecê-las.





Texto e fotos de José Luís Peixoto

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