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José Luís Peixoto

GALVEIAS, REGRESSO A CASA

Atualizado: 30 de out. de 2020

Entro com a minha mãe no quintal da nossa casa





Entro com a minha mãe no quintal da nossa casa.

A terra está coberta por folhas de várias estações.

Os pessegueiros perguntam por onde andámos,

porque demorámos tanto. As plantas dos canteiros

transbordaram, embaraçaram-se numa espécie de

desespero. A água do tanque de lavar a roupa é

verde. O pombal não tem pombos. A coelheira

não tem coelhos. A capoeira está habitada pela

memória de galinhas submissas e galos no poleiro,

desconfiados de qualquer movimento. Às vezes,

como antes, sentimos a chegada da gata, é uma

presença, uma intuição, vem cumprimentar-nos,

é uma gata livre, salta pelos quintais, escolhe as

pessoas com quem quer estar, apesar de invisível,

é agora o fantasma de uma gata. Ao fim da tarde,

com as janelas abertas, o que escreve a minha mãe

sobre a mesa da cozinha? Muito provavelmente,

escreve postais aos mortos, dá-lhes notícias com

a sua caligrafia de voltas demoradas. Ela própria

receberá esses postais quando for às casas vazias

ver se há correio.




Poema de José Luís Peixoto, in Regresso a Casa, 2020, publicado por Quetzal (Portugal) e Dublinense (Brasil)

Livro em pré-venda AQUI (Portugal), AQUI (Brasil) e AQUI (México, em tradução castelhana).

Nas livrarias a 14 de agosto de 2020


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